
Tipos de Yoga: Tradição, Filosofia e Estilos Modernos (Parte II)
Yoga Moderno | Formas de Haṭha Yoga (Guia Completo)
Na Parte I deste artigo percorremos a Roda do Yoga Tradicional, compreendendo seus caminhos filosóficos e espirituais — as raízes que sustentam toda a prática. Agora damos continuidade a essa jornada, chegando ao Yoga tal como ele é vivido hoje: nas salas de aula, nos estúdios e nas plataformas digitais.
Embora a tradição apresente nomes como Rāja Yoga, Bhakti, Jñāna e Haṭha, no cenário contemporâneo surgem expressões como Vinyasa, Ashtanga, Power Yoga, Yin Yoga, Restaurativo e muitos outros. À primeira vista, podem parecer universos distintos, mas todos eles brotam da mesma fonte ancestral.
Neste guia do Yoga moderno, você vai entender:
como surgiram as modalidades contemporâneas,
o que diferencia cada estilo,
e por que todos eles são, essencialmente, formas modernas de Haṭha Yoga — o caminho que utiliza o corpo, a respiração e a energia como instrumentos de transformação interior.

A tradição continua viva — só ganhou novos formatos
A tradição do Yoga nunca foi estática. Ao contrário: ela se renova, se reinventa e se adapta às transformações sociais e culturais de cada época. Embora o Yoga seja essencialmente um só, seus caminhos se multiplicam — e cada praticante encontra o estilo que melhor apoia sua fase de vida, sua sensibilidade e seu propósito.
Hoje, quando buscamos aulas de Yoga, encontramos nomes como:
Vinyasa,
Power,
Yin,
Restaurativo,
Ashtanga,
Slow Flow,
entre outros.
Esses termos podem soar muito diferentes daqueles ligados ao Yoga tradicional, mas existe uma ligação profunda entre eles.
A verdade é simples: todos os estilos modernos são derivações do Haṭha Yoga — interpretações contemporâneas de um caminho que integra corpo, respiração, foco e energia.
Cada estilo enfatiza um aspecto: alguns priorizam fluidez, outros força, outros introspecção, outros estabilidade mental. Mas todos compartilham a mesma base.
Lembrando que o Haṭha Yoga tradicional inclui:
posturas (āsanas),
exercícios respiratórios (prāṇāyāma),
técnicas de concentração (dhāraṇā),
meditação (dhyāna),
selos energéticos (mudrās),
mantras,
e processos de purificação.
É desse sistema amplo e profundo que nascem todas as modalidades modernas.
1. Iyengar Yoga
O Iyengar Yoga, criado por B.K.S. Iyengar, é um método baseado em precisão, alinhamento e inteligência corporal. Discípulo direto de T. Krishnamacharya, Iyengar sistematizou mais de 200 posturas e 14 técnicas clássicas de prāṇāyāma, criando um sistema terapêutico e acessível a diferentes corpos e idades.
As aulas de Iyengar se caracterizam por:
sequências lentas e estruturadas,
permanências prolongadas,
ajustes detalhados,
foco em alinhamento,
uso de acessórios (props)
O método cultiva consciência corporal, estabilidade mental e presença meditativa.
2. Ashtanga Yoga
O Ashtanga Yoga, estruturado por Sri K. Pattabhi Jois, é um sistema tradicional baseado na sincronização entre respiração e movimento (vinyasa). Essa integração gera calor interno (tapas), promove purificação e estabiliza a mente.
O método segue séries fixas:
Série Primária (Yoga Chikitsa) — purificação e alinhamento,
Série Intermediária (Nadi Shodhana) — limpeza energética,
Séries Avançadas (Sthira Bhaga) — força e estabilidade elevadas.
Formas de prática:
Mysore Style: Prática tradicional, em silêncio. Cada aluno segue seu ritmo enquanto o professor oferece orientação individual.
Aula conduzida: Todos praticam juntos, seguindo as contagens de vinyasa em sânscrito.
3. Yin Yoga
O Yin Yoga é uma prática lenta, meditativa e introspectiva, composta predominantemente por posturas sentadas ou deitadas, mantidas por vários minutos.
Seu objetivo é estimular suavemente os tecidos conjuntivos — fáscia, tendões, ligamentos e cápsulas articulares — estruturas que tendem a se enrijecer ou desidratar com o tempo, o estresse e a inatividade.
Ao aplicar tensões leves e sustentadas, o Yin Yoga promove hidratação, flexibilidade e reorganização da fáscia, favorecendo maior mobilidade e sensação de espaço interno.
O método também é influenciado pela Medicina Tradicional Chinesa (MTC), incorporando seus princípios energéticos e sua visão sobre equilíbrio interno. Por isso, a prática não atua apenas no corpo físico: ela convida à quietude, à entrega e ao cultivo de presença.
O Yin é adequado tanto para iniciantes quanto para praticantes experientes — embora, para muitos, o maior desafio inicial não seja físico, mas mental: permanecer imóvel e consciente por vários minutos em cada postura. É justamente nessa pausa que a prática revela seu caráter meditativo e transformador.
4. Yoga Restaurativo
O Yoga Restaurativo é um método profundamente relaxante e terapêutico, desenvolvido a partir do trabalho de Judith Hanson Lasater, Ph.D., criadora dos programas Relax and Renew® e Advanced Therapeutics.
Sua abordagem combina posturas passivas do Yoga tradicional com princípios de fisiologia do relaxamento, utilizando acessórios que oferecem suporte total ao corpo.
O foco do Restaurativo é ativar a resposta natural de repouso e recuperação do sistema nervoso, criando um ambiente interno de segurança, calma e entrega. Cada postura é estruturada com o auxílio de muitos props — bolsters, cobertores, cintos, blocos, almofadas, sacos de areia — que sustentam o corpo de maneira confortável e estável, permitindo relaxamento profundo sem esforço muscular.
As permanências costumam ser longas, geralmente acima de cinco minutos, e as sensações são de acolhimento, suavidade e quase um convite ao sono consciente. A prática desacelera a mente, regula o sistema nervoso e oferece apoio emocional, sendo indicada para momentos de estresse, cansaço, ansiedade ou necessidade de cuidado.
No Restaurativo, menos é mais: não se trata de fazer muitas posturas, mas de habitar cada uma com presença e rendição.
5. Power Yoga
O Power Yoga é uma vertente vigorosa e dinâmica do Hatha, inspirada diretamente no Ashtanga Yoga, mas com maior liberdade criativa. Embora compartilhe muitos de seus benefícios — aumento do calor interno, força, resistência, flexibilidade e foco mental — o Power se diferencia por permitir que cada professor organize a prática em sequências variadas, adaptadas ao grupo e ao propósito da aula. Por isso, nenhuma sessão é exatamente igual à outra.
O objetivo central do Power Yoga é oferecer um trabalho muscular intenso aliado à respiração consciente e à concentração, preservando os princípios fundamentais do Yoga tradicional enquanto promove uma experiência fisicamente desafiadora e energizante.
A prática é especialmente indicada para quem busca:
fortalecer o corpo,
melhorar a capacidade cardiovascular,
aumentar a queima calórica,
expandir limites físicos com consciência,
e, ao mesmo tempo, cultivar foco, presença e autocontrole.
Apesar do ritmo acelerado, o Power Yoga não perde sua essência: é movimento com propósito, respiração com direção e força orientada pela atenção plena.
6. Vinyasa Yoga
A palavra vinyāsa vem de duas raízes sânscritas: vi, que significa “de modo especial”, e nyāsa, que significa “colocar”. Assim, o termo descreve a maneira como movimento e respiração são coordenados de forma consciente e precisa, tanto nas posturas quanto nas transições entre elas. É essa integração que transforma a prática em uma verdadeira meditação em movimento.
O Vinyasa Yoga tem suas bases no ensino de T. Krishnamacharya, uma das figuras mais influentes do Yoga no século XX e amplamente reconhecido como um dos grandes responsáveis pela expansão do Yoga moderno. A partir de sua metodologia, surgiram estilos contemporâneos que utilizam o fluxo contínuo e a respiração ritmada como fio condutor da prática.
No Vinyasa, cada inspiração e expiração orienta uma ação do corpo: entrar, sustentar, sair ou transitar entre posturas. O ritmo pode variar — mais suave, mais intenso, mais criativo — mas a essência permanece a mesma: movimento consciente guiado pela respiração.
O estilo é indicado para quem busca uma prática dinâmica, fluida e ao mesmo tempo centrada, capaz de fortalecer o corpo, cultivar presença e expandir a capacidade respiratória.
7. Slow Flow
O Slow Flow é uma das modalidades contemporâneas do Yoga que nasce do vinyasa, mas traduzida em um ritmo mais suave, introspectivo e acolhedor. É ideal para quem aprecia a fluidez do vinyasa, porém deseja uma prática menos intensa, com foco em calma, presença e suavidade.
Assim como no vinyasa, os movimentos são coordenados com a respiração — cada transição acontece ao compasso do inspirar e do expirar — mas o ritmo é deliberadamente mais lento. Isso permite maior atenção aos detalhes, mais consciência na movimentação e uma experiência mais meditativa do fluxo.
É uma prática fluida, delicada e que equilibra movimento e quietude de maneira inteligente e sensível.
8. Kuṇḍalinī Yoga
O Kuṇḍalinī Yoga é um estilo contemporâneo que combina cânticos, exercícios respiratórios, kriyās, posturas repetitivas e meditação. Seu objetivo declarado é despertar a kuṇḍalinī–śakti, a energia potencial adormecida na base da coluna — metáfora tradicional para o nosso poder interno, vitalidade, criatividade e consciência expandida.
Percebe a semelhança com o Haṭha Yoga? Sim — porque a base é a mesma. Historicamente, o Kuṇḍalinī Yoga no formato que conhecemos hoje ficou associado a Yogi Bhajan, que sistematizou e difundiu esse método no Ocidente a partir da década de 1960. Embora tenha ganhado características próprias, trata-se essencialmente de mais uma interpretação moderna do Haṭha Yoga, com uma ênfase particular em respiração, ritmo, repetição e estados meditativos.
Muitas pessoas descrevem o Kuṇḍalinī como “o Yoga mais espiritual”, mas, do ponto de vista tradicional, isso não se sustenta. Todos os caminhos de Yoga têm o mesmo objetivo: o autoconhecimento e a libertação do sofrimento (mokṣa). A forma pode mudar — mais ativa, mais meditativa, mais devocional ou mais energética — mas a finalidade é sempre a mesma.
O diferencial do kuṇḍalinī moderno está na combinação de técnicas vigorosas de respiração, movimentos ritmados, mudrās e mantras, que criam uma experiência intensa e, muitas vezes, emocionalmente transformadora.
9. Bikram Yoga
O Bikram Yoga é um estilo de Yoga desenvolvido por Bikram Choudhury e popularizado a partir da década de 1970. A metodologia se baseia em uma sequência fixa de 26 posturas e 2 exercícios respiratórios, praticados sempre na mesma ordem, em uma sala aquecida a cerca de 41 °C (105 °F) com umidade em torno de 40%.
A intenção inicial era reproduzir condições climáticas semelhantes às da Índia e, ao mesmo tempo, promover calor interno, sudorese intensa e sensação de purificação.
As salas de prática costumam ter paredes espelhadas e tapetes já posicionados, e os professores tradicionalmente não fazem ajustes manuais — seguindo o formato estabelecido pela escola de Bikram.
Embora o método tenha conquistado grande popularidade global, especialmente nos Estados Unidos, o nome Bikram também se tornou associado a controvérsias sérias, incluindo acusações públicas e processos legais envolvendo seu fundador. Essas questões receberam forte atenção da mídia e foram documentadas em livros, reportagens e em um documentário disponível na Netflix que explora o tema em profundidade.
É importante notar que muitos estúdios optaram por se afastar do nome “Bikram”, passando a adotar expressões como Hot Yoga ou Hot 26, mantendo a estrutura da sequência, mas desvinculando-se da figura do criador.
10. Sivananda Yoga
O Sivananda Yoga é um sistema tradicional estruturado por Swami Vishnudevananda (1927–1993), discípulo direto de Swami Sivananda, um dos grandes mestres do século XX. Em honra ao seu guru, Vishnudevananda nomeou tanto o método quanto a organização internacional responsável por sua difusão — os Centros Sivananda Yoga — dedicando sua vida à missão de ensinar Yoga e promover a paz mundial.
Embora inclua posturas físicas, o Sivananda Yoga é um sistema holístico, que integra filosofia, respiração, relaxamento, alimentação, meditação e serviço altruísta. A prática não se reduz ao āsana; ela propõe um estilo de vida pautado nos valores do Yoga clássico.
A estrutura das aulas segue uma sequência tradicional composta por 12 posturas básicas, praticadas de forma progressiva e com permanências suficientes para que corpo, respiração e mente se harmonizem. O ritmo é sereno e introspectivo, com espaçamentos generosos entre as posturas, foco na respiração e momentos dedicados à meditação e ao relaxamento profundo.
11. Yogaterapia
A Yogaterapia é uma disciplina que utiliza ferramentas do Yoga — posturas, respiração, relaxamento e meditação — de forma adaptada e direcionada para aliviar, acompanhar ou complementar tratamentos de condições físicas, emocionais e psicológicas. Seu foco principal não é mokṣa ou o autoconhecimento profundo, mas sim a saúde, o equilíbrio funcional e o bem-estar do corpo e da mente.
Diferente das vias tradicionais, que assumem a saúde como um “benefício colateral” do caminho espiritual, a Yogaterapia atua diretamente sobre o plano denso, trabalhando questões como dores musculares, ansiedade, insônia, depressão leve, problemas respiratórios, alterações posturais, estresse crônico e outras disfunções.
Ela utiliza as mesmas ferramentas do Haṭha Yoga — āsanas, prāṇāyāma, relaxamento e técnicas de concentração — porém organizadas como práticas terapêuticas personalizadas, ajustadas às necessidades específicas de cada pessoa. O foco é funcional, clínico e integrativo.
Todas as formas de Haṭha Yoga, de maneira indireta, naturalmente promovem saúde e equilíbrio. No entanto, nas tradições clássicas esse não é o objetivo final — é apenas um bônus que surge no processo de busca por liberdade interior.
12. Jivamukti Yoga
O Jivamukti Yoga é um método contemporâneo criado em 1984, em Nova York, por David Life e Sharon Gannon. Tornou-se um dos estilos de Yoga moderno mais conhecidos internacionalmente por unir prática física vigorosa, fundamentos éticos e um forte compromisso com valores espirituais.
A prática do Jivamukti é baseada no Vinyasa, com sequências dinâmicas, transições fluidas e ênfase na união entre movimento e respiração. No entanto, o método vai muito além da parte física, estruturando-se em cinco princípios centrais:
Śāstra (escrituras) — estudo das tradições do Yoga, incluindo textos clássicos como os Yoga Sūtra, Bhagavad Gītā e obras do Vedānta;
Bhakti (devoção) — cultivo da entrega, do amor e da conexão com o divino;
Ahiṃsā (não violência) — base ética central do método, inspirando escolhas conscientes, respeito e compaixão;
Nāda (som/música) — uso de mantras, música devocional e vibração sonora como ferramenta meditativa;
Dhyāna (meditação) — quietude, contemplação e presença como essência da prática.
Além desses pilares, o Jivamukti Yoga é reconhecido por enfatizar valores éticos e ativismo, especialmente relacionados a direitos dos animais, veganismo, sustentabilidade e responsabilidade ambiental. A prática, portanto, não se limita ao tapete: propõe que o Yoga seja vivido como um compromisso social e espiritual.
Outros estilos...
Além dos métodos apresentados, é comum encontrar nas grades modernas nomes como Hatha Flow, Gentle Yoga, Yoga Suave, Rocket Yoga, Hot Yoga, Yoga Nidra, AcroYoga, Aerial Yoga, Yoga Integral, Yoga para Gestantes, entre outros.
Cada um possui ritmos e propostas próprias, mais dinâmicas ou mais tranquilas, mais criativas ou mais tradicionais — mas todos continuam sendo expressões contemporâneas de um mesmo tronco: o Haṭha Yoga. São apenas diferentes portas de entrada para a mesma experiência interna.

Haṭha Yoga — a raiz de todos os estilos modernos
Ainda hoje, muitas escolas oferecem aulas chamadas simplesmente de Haṭha Yoga, preservando o nome tradicional. Esse é um dos termos que mais aprecio, porque geralmente engloba ensinamentos do Tantra, do Vedānta e ensinamentos de Rāja Yoga, Mantra Yoga, Kriyā Yoga e Bhakti.
Ou seja: não é apenas uma aula de posturas — é um caminho completo que conduz ao propósito essencial do Yoga: mokṣa, a liberdade e o reconhecimento da nossa verdadeira natureza.
E ainda que não busque benefícios físicos como objetivo principal, o Haṭha Yoga moderno oferece ao praticante um conjunto precioso de efeitos “extras”: mais saúde, mais clareza, mais estabilidade emocional. Eles não são o foco — mas naturalmente florescem quando caminhamos com disciplina e devoção.
Quando observamos atentamente, fica evidente: o nome muda, o ritmo muda, a metodologia muda — mas a essência permanece a mesma. No fundo, seguimos praticando o bom e velho Haṭha Yoga.
Conclusão
Agora que você conhece com mais profundidade os principais estilos de Yoga moderno, talvez seja o momento de experimentar. Procure um professor qualificado, alguém que, mesmo ensinando métodos contemporâneos, preserve a tradição e mantenha viva a transmissão de mestre para discípulo — o paramparā que sustenta o Yoga há tantos séculos.
Pratique com curiosidade, escute seu corpo, observe suas necessidades e permita-se encontrar o estilo que realmente ressoa com o seu momento. E lembre-se:
não se prenda aos nomes. Eles são apenas caminhos. O Yoga é o destino — o retorno à sua essência, ao silêncio que habita você, ao autoconhecimento.
Que sua prática seja profunda, sincera e que você encontre o Yoga que toque o seu coração e o conduza com clareza ao seu próprio centro.
Hariḥ Oṁ
Patrícia de Abreu












