Os textos antigos nos dizem que, pelo uso dos bandha-s, agni, o fogo da vida pode ser direcionado ao lugar exato onde o “lixo” está estabelecido, bloqueando o fluxo de energia no corpo...
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No universo do Yoga, o corpo é muito mais do que apenas físico. Ele é um instrumento para canalizar energias e acessarmos níveis mais sutis de consciência.
Quando praticamos posturas, respiração e meditação, também ativamos mecanismos internos que nos ajudam a manter essa energia fluindo de maneira harmoniosa e eficiente. Um desses mecanismos é o uso dos bandha-s, ou "fechos energéticos", que desempenham um papel essencial na circulação da força vital, o prāṇa.
Os bandha-s são técnicas fundamentais no Haṭha Yoga, e sua prática não se limita apenas à estabilização física. Eles são uma ponte entre o corpo físico e o corpo energético, promovendo equilíbrio, foco mental e a potencialização de nossa energia interna. Quando realizados corretamente, essas contrações sutilmente conduzem o fluxo de prāṇa pelos canais adequados, abrindo o caminho para o despertar de nossa potência latente, a kuṇḍalinī.
Neste texto, exploraremos como os bandha-s atuam nos níveis físico e energético, seus benefícios e suas variações conforme os textos clássicos do Yoga. Além disso, vamos desmistificar possíveis confusões entre essas técnicas e exercícios da fisioterapia pélvica.
Prepare-se para mergulhar nesse conhecimento profundo e descobrir como as ativações energéticas podem transformar sua prática de Yoga.
"A palavra sânscrita bandha significa 'segurar', 'apertar' ou 'trancar'. Essas definições descrevem precisamente a ação física envolvida nas práticas de bandha e seu efeito sobre o corpo prânico. Os bandha-s visam bloquear os prāṇas em áreas específicas e redirecionar seu fluxo para o suṣumnā nāḍī com o propósito de despertar espiritual." Swami Satyananda Saraswati
A palavra bandha, em sânscrito, significa "fecho" ou "trava" e deriva da raiz bandh, que se refere a "ligar", "fixar" ou "amarrar". Nos ensinamentos do Haṭha Yoga, os bandha-ssão técnicas que envolvem a ativação de áreas específicas do corpo físico, com o objetivo de canalizar e controlar o fluxo energético. Essas "contrações" atuam tanto no nível sutil quanto no físico.
Embora muitas vezes usados como sinônimos, contração e ativação são conceitos distintos, especialmente no contexto do Yoga e das práticas corporais. Contraçãorefere-se a um movimento muscular visível, em que os músculos se encurtam e geram força, como ocorre em muitos exercícios físicos convencionais. Já a ativação envolve um engajamento mais sutil e consciente dos músculos, muitas vezes sem que haja um movimento aparente.
No Yoga, a ativação muscular, como no caso dos bandha-s, está relacionada à intenção de despertar determinadas áreas energéticas, mantendo uma consciência constante de como essas áreas interagem com o corpo e a mente. Portanto, enquanto a contração é mais física, a ativação é tanto física quanto energética, conectando corpo, mente e prāṇa (energia vital).
Principais Bandha-s:
Uḍḍīyana Bandha: Ativação do abdômen.
Mūla Bandha: Ativação do assoalho pélvico.
Jālandhara Bandha: Ativação da garganta.
Bandha Traya: Ativação tríplice (combinação de Uḍḍīyana, Mūla e Jālandhara bandha-s).
Jihva Bandha: Ativação da língua.
Mahā Bandha: A "grande contração", que une os três principais bandha-s (Bandha Traya) com o Jihva Bandha.
"Os bandha-s desempenham um papel importante nos processos de purificação do Yoga. Enquanto que o prānāyāma ajuda a reduzir os resíduos que se acumulam no corpo pelo direcionamento de agni, o fogo da vida. Bandha-s são os meios pelos quais este processo pode ser intensificado. Os textos antigos nos dizem que, pelo uso dos bandha-s, Agni pode ser direcionado ao lugar exato onde o “lixo” está estabelecido, bloqueando o fluxo de energia no corpo. Os bandha-s intensificam o efeito do fogo." T.K.V Desikachar
Efeitos no Corpo Físico
No nível físico, a prática dos bandha-s proporciona uma maior estabilidade ao corpo, garantindo uma prática de Yoga mais segura. Eles ajudam a manter o calor interno, o que pode prevenir lesões e aumentar a firmeza corporal durante as posturas. Esse controle físico é fundamental para a execução de posturas mais avançadas e intensas.
Efeitos no Corpo Energético
"Como os bandha-s, por outro lado, nos ajudam a tomar consciência da energia vital, eles funcionam como uma ponte que liga o corpo físico ao corpo sutil, nos ajudando desta maneira a unir e focar as nossas próprias forças. Isso é Yoga, união." Pedro Kupfer
No nível sutil, os bandha-s evitam a dispersão da prāṇa (energia vital) e direcionam seu fluxo pelos canais energéticos corretos, ou nāḍīs. Dessa forma, eles auxiliam no despertar da energia potencial, conhecida como kuṇḍalinī, armazenada na base da coluna vertebral.
Quando ativados corretamente, os bandha-s rompem bloqueios energéticos, nós ou granthi-s, que impedem o livre fluxo da energia pela suṣumnā nāḍī (canal energético central). Os principais nós psíquicos associados a esses bloqueios são:
Mūla Bandha – Atua sobre o brahmā granthi (localizado no chakra raiz).
Uḍḍīyana Bandha – Relaciona-se com o viṣṇu granthi (localizado no chakra do plexo solar).
Jālandhara Bandha – Age sobre o rudra granthi (localizado no chakra da garganta).
"Esses três bandha-s atuam diretamente nos três granthi-s ou nós psíquicos. O mūla bandha está associado ao brahmā granthi , o uḍḍīyana bandha ao viṣṇu granthi e o jālandharabandha ao rudra granthi. Os granthi-s impedem o fluxo livre de prāṇa ao longo do suṣumnā nāḍī e, assim, dificultam o despertar dos chakras e a ascensão da kuṇḍalinī."Swami Satyananda
Assim, ao ativar os bandha-s, impulsionamos o fluxo de prāṇa, quebrando esses bloqueios e permitindo que a energia flua livremente através do canal central. Isso abre caminho para o despertar do nosso potencial energético.
"O jālandhara Bandha, o uḍḍīyana Bandha e o mūla Bandha estão situados, respectivamente, na garganta, no abdômen e no períneo. Se a duração desses bandha-s puder ser aumentada, então onde está o medo da morte?" Sutra 5 | Yogataravali | Adi Shankaracharya
Bandhas e Fisioterapia Pélvica: Entendendo as Diferenças
Uma confusão comum ocorre entre o Mūla Bandha, que envolve a ativação do assoalho pélvico, e as práticas de fisioterapia pélvica, como os exercícios de Kegel. Embora ambos se refiram à ativação dos músculos dessa região, os objetivos e o enfoque de cada prática são bem distintos.
Mūla Bandha: No contexto do Yoga, o Mūla Bandha tem um propósito energético e sutil. Ele é utilizado para controlar e canalizar a energia vital (prāṇa), com o objetivo de impulsionar o fluxo energético e favorecer o despertar espiritual. A contração não se trata apenas de fortalecer músculos, mas de ativar uma área energética relacionada ao chakra raiz (mūlādhāra), que é vista como a base da nossa energia vital.
Fisioterapia Pélvica: Por outro lado, os exercícios de fortalecimento do assoalho pélvico, frequentemente usados na fisioterapia pélvica, têm um foco puramente físico. Eles são usados para fortalecer os músculos dessa região com o objetivo de melhorar a saúde pélvica, prevenir incontinência urinária, e promover a reabilitação pós-parto ou cirurgias. O objetivo é físico e funcional, sem ênfase na canalização de energia vital ou objetivos espirituais.
Portanto, apesar de o Mūla Bandha também envolver a ativação dos músculos do assoalho pélvico, sua função dentro do Yoga é mais abrangente e está vinculada ao campo energético e espiritual do praticante.
Benefícios Adicionais
Embora não seja o objetivo dos bandha-s como vimos anteriormente, a prática sistemática dos mesmos pode resultar em inúmeros benefícios para o corpo e a mente. Entre eles, destacam-se:
Sistema endócrino: Regulação e equilíbrio hormonal.
Sistema nervoso: Fortalecimento e maior resiliência a estímulos externos.
Órgãos internos: Melhora no funcionamento dos órgãos internos, especialmente na digestão e circulação.
Foco mental: A mente torna-se mais concentrada e focada, favorecendo estados meditativos mais profundos.
"É possível perceber melhoras no sistema endócrino, no funcionamento dos órgãos internos, no sistema nervoso, bem como no funcionamento da própria mente, que fica mais focada e torna-se assim mais apta para a concentração." Pedro Kupfer
Bandhas e o Despertar Espiritual
O propósito final dos bandha-s é bloquear e redirecionar os prāṇās para o suṣumnā nāḍī, com o objetivo de facilitar o despertar espiritual. Eles podem ser praticados de forma isolada ou combinados com técnicas de mudrās e prāṇāyāmas. Quando integrados, os bandha-s intensificam as práticas de Yoga superiores, despertando as faculdades psíquicas e espirituais do praticante.
Em tradução ao verso II:46 da Haṭha Yoga Pradīpikā, o professor Pedro Kupfer explica:
"Por meio de uma rápida ativação do períneo, [adhastāt, consegue-se o mūlabandha]. Ao mesmo tempo deve ser feita a ativação da garganta, [kaṇṭhasaṅkoca, i.e., jalāṇḍharabandha]. A força vital é conduzida para o canal central, brahmanāḍi, com [a ajuda] do alongamento posterior do abdômen [paścimatānena i.e., uḍḍīyānabandha]. [Noutras palavras, praticando-se jalāṇḍharabandha, mūlabandha e uḍḍīyānabandha ao mesmo tempo, o prāṇa flui por suṣumṇā. Ao dizer madhye paścimatānena, Svātmārāma refere-se aqui à ativação do baixo ventre (literalmente, o “alongamento da parte posterior medial”), e não ao paścimottānāsana, a conhecida postura da pinça.]" Pedro Kupfer
Classificação dos Bandhas
Tradicionalmente, os bandha-s eram classificados como parte dos mūdra-s e eram transmitidos oralmente de guru para discípulo. A Haṭha Yoga Pradīpikā, trata dos bandha-s e mūdra-s juntos, e os antigos textos tântricos também não fazem distinção entre os dois. Os bandha-s são amplamente incorporados tanto em mūdras quanto em técnicas de prāṇāyama. No entanto, sua ação de "bloqueio" revela-os como um grupo de práticas fundamentalmente importantes por si só.
Segundo dois textos clássicos do Yoga, as descrições dos principais bandha-s variam levemente:
Haṭha Yoga Pradīpikā:
Uḍḍīyana Bandha: Ativação do abdômen.
Mūla Bandha: Ativação do assoalho pélvico.
Jālandhara Bandha: Ativação da garganta.
Bandha Traya: Ativação tríplice.
Jihva Bandha: Ativação da língua.
Mahā Bandha: Grande Ativação (combinação do Bandha Traya e Jihva Bandha).
"Quando [o yogin] tiver conquistado a firmeza e a perfeição no siddhāsana, poderá desfrutar da calma proporcionada [pelo estado meditativo chamado unmanyavasthā], que surge espontaneamente; os três bandhas aparecem de forma natural, sem esforço." I:44.
"Impulsionando o apāna para cima [com a ajuda do mūlabandha] e fazendo descer o prāṇa a partir da garganta [com o auxílio do jalāṇḍharabandha], o yogin livra-se da velhice e torna-se [saudável, enérgico e bem disposto] como um jovem de dezesseis anos." II:47.
Gheraṇḍa Saṁhitā:
Uḍḍīyana Bandha: Ativação flutuante (abdômen).
Jālandhara Bandha: Ativação da garganta.
Mūla Bandha: Ativação raiz (assoalho pélvico).
Mahā Bandha: Grande Ativação.
Mahā Vedha: Grande penetrador.
"Quem praticar diariamente mūla bandha e mahā bandha com mahāvedha é o melhor dos yogi-s. Para ele não existe o medo da morte. A decadência não o alcança. Os yogi-s devem mantê-lo em segredo." 3:23
"Os seus efeitos foram amplamente comprovados e proporciona excelentes resultados. Quem o praticar durante seis meses certamente alcançará o seu objetivo." 3:13
Prática de Yoga
"Pessoalmente, considero muito importante a associação dos bandha-s com os āsanas, uma vez que o praticante ganha uma maior consciência do próprio corpo e da maneira em que a prática do Haṭha Yoga age sobre ele." Pedro Kupfer
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Hariḥ Oṁ
Patricia de Abreu ॐ